sábado, 1 de junho de 2019

Escritos de Yara - EL DORADO – No 3 / BOGOTÁ

EL DORADO – No 3 / BOGOTÁ


Yara de Nerea

Curitiba, outubro / 2013

Passando o Equador lá estão eles, ressurgidos das cinzas. Somam 47 milhões de almas. Merecem respeito.

Banhada por 1.200 rios, a terra é pródiga. Recursos naturais, de toda espécie. Acreditam que, no futuro, o país será o celeiro do mundo.

Colômbia - o início e logo depois: em busca do El Dorado, Gonzalo Jimenéz de Quesada, saiu de Cartagena das Índias subindo o rio Madalena / 1.600 km.. Massacrou e escravizou os muiscas, naturais do Altiplano / Cordilheira Oriental dos Andes. Ergueu Santa Fé de Bogotá / 1538, proclamando que aquelas terras eram a Nova Granada.

Ele e sua trupe ficaram encantados com o clima. As temperaturas, mais parecidas com as da Espanha. A beira mar, particularmente no Caribe assavam dentro das vestimentas pretas e das botas de cano alto. Isto sem falar naquela gargantilha branca frufrusada e engomada.

Dependente de Lima / Peru, em 1717 passou a vice-reinado, incluindo o Panamá, o Equador e a Venezuela.

Anos de carnificina os levaram à independência em 1819. O país ganhou novo nome, Grã- Colômbia, sendo Simón Bolívar o presidente da República, que na verdade não era República. O venezuelano reinou por 11 anos. Uma tuberculose galopante o tirou do poder e da vida.

Aproveitando o ensejo, o Equador e a Venezuela foram tratar da própria vida. O Panamá, em 1903.

Jorge Gaitán, líder liberal foi assassinado / 1948, o que desencadeou desenfreada violência. Os militares tomaram o poder. Como muitos desejam o comando inventaram As Forças Armadas da Colômbia – FARC.

Na esbórnia ambiente, a partir de 1970 os cartéis do narcotráfico deslancharam. Na década de 80, em comunhão com as FARC, a produção e o comércio de cocaína fizeram a festa do bode.

Os “Ms“ do país e dos Estados Unidos / 1990 colocaram em cena, os que tinham licença pra matar. Entre outros executaram Pablo Escobar, o poderoso chefão de Medellín.

Privilegiada com talentos, a Colômbia arrasa internacionalmente. Gabriel Garcia Márquez é Nobel de Literatura. As obras plásticas de Fernando Botero, requisitadas mundo a fora. Na música, destaca-se Shakira que quebra a mesmice das estrelas pop, com sua dança do ventre. Nas virtudes: o Vaticano acaba de canonizar Madre Laura, também de Medellín.


BOGOTÁ


Plantada na montanha a 2.640 metros, a Capital abriga 9 milhões de habitantes. Com relação ao Brasil, o fuso marca 2 horas a menos. Essas são contadas em AM e PM, considerando-se o antes e o depois do meio-dia.

Os meses de chuva indicavam o inverno. Com o clima destrambelhado, agora chove a qualquer momento. Quando o sol aparece é verão, mas a temperatura não excede aos 19 graus. O deus sol dos muiscas poupa suas energias. Resumo: faz frio o ano inteiro.

As ruas são identificadas por números. Parques, praças e jardins minimizam a agonia provocada pelo trânsito. Pro transporte coletivo importaram de Curitiba o biarticulado, que se intitula TransMilênio. Comentam que funciona bem.

O governo não dá facilidades aos meliantes. Portando metralhadoras cinematográficas, o Exército está nas ruas. Tem polícia montada e a civil se faz acompanhar por cachorros apavorantes.

Como no restante do planeta, os ingleses foram pra construir ferrovias. Levaram o conceito das edificações com tijolo à vista. Por toda a cidade, até nas favelas, casas e prédios luzem-se com os tons variados da argila.

A metrópole é famosa por seus restaurantes internacionais de 1o linha.
Os pratos típicos levam milho, vários tipos de batata, carne de boi, de porco, de galinha, arroz, farinha de diferentes raízes incluindo a mandioca - adoram comê-la frita. Ainda, abacate, coco e banana / plátano de diferentes modos, verde ou madura. Pro nosso paladar, os sabores são inusitados.
Além de café bebem a água aromática: chá quente com ervas e frutas picadas. Delicioso e corriqueiro, o chá da folha da coca.

O Centro Histórico: casarões coloniais com seus balcões e grandes portas converteram-se em lojas, hotéis, restaurantes, museus, bancos, escritórios, repartições públicas. A graciosidade do conjunto impressiona. As gentes cuidam de preservar sua memória.

Catedral Primaz / 1539: restaurada em 1808 louva a Imaculada Conceição, com toda a majestade das igrejas espanholas.

Igreja da Candelária / 1635: no altar, ouro e mais ouro.

Tudo é música naquelas bandas. Impera a salsa caribenha. A cumbia e outros ritmos andinos soam como as nossas sertanejas ou rancheiras. Cantam – claro – o amor e a vida dos do campo. Os artistas vêm com figurinos regionais próprios pra cada ritmo. Dançam em rodopios. As mulheres, abrindo a saia, mostram os bordados e os desenhos do tecido.

Museu do Ouro: citado entre os lugares que se deve conhecer antes de morrer. Acervam 34 mil peças. Criações que remontam há mais de mil anos antes de Cristo.


Em ouro de 22 quilates, sob iluminação perfeita, as peças faíscam. Muitas se entrelaçam com esmeraldas, jade, âmbar e corais. Outras tantas filigranadas. Várias esculpidas com representações do sol, da lua, dos órgãos genitais, de animais. O jaguar, serpentes, rãs, macacos, pássaros são os mais reverenciados. Nas cerimônias, o pedido principal aos deuses ficava em torno da fertilidade. Alimentos e filhos.

Estrelas da Exposição

Jarros onde guardavam a carapaça pulverizada do caracol. A massa era mastigada com folhas da coca. Misturada com a saliva, potencializava a energia necessária pras lidas do dia a dia nas alturas.

Adornos do chefe calima, da cabeça aos pés. Tanta beleza atordoa, incluindo penacho feito com pássaros da Amazônia colombiana.

Espirais: grandes, médias e pequenas. Desenho que aparece em muitas culturas milenares.

O que representam???? Dizem que as galáxias. Dizem que o sistema planetário, com as esferas dando voltas em torno do deus sol. Dizem que representam a trajetória evolutiva da nossa espécie. Ainda, que no labirinto da existência, as espécies caminham sem volta pro centro, onde a vida acaba.

O Ponto Altíssimo

A pequenina balsa muisca conta o mito do El Dorado.
O cacique era levado por 4 xamãs à lagoa de Guatavita. Ritual de adoração à Mãe Terra - Chía. Com o corpo coberto de ouro em pó, levando oferendas, mergulhava nas águas sagradas.

Os espanhóis, enfim, encontraram o El Dorado. Algumas das joias que retiraram da lagoa são mostradas, junto a uma projeção sobre o tema. Em dado momento, luzes enfocam no piso a lagoa com seus tesouros. A música muisca torna o clima ainda mais arrebatador.
Ensinavam os da terra: “cantamos para viver e dançamos para não morrer“.

Cerro de Monserrate: funicular / 1928 voa por 4 minutos levando as gentes ao mirante / santuário. A montanha eleva-se a 3.152 m.. Floresta e cidade, panorama olímpico. Os católicos fazem - também a pé - peregrinações à Igreja do Cristo Caído. Pelo que se vê em toda parte são fixados nos acontecimentos da via dolorosa. As 14 estações em bronze, de Ludovico Consorti, rodeiam as edificações do cume.

Como também de pão vive o Homem, 2 restaurantes chiquetérrimos atendem - pra almoço e janta - a malta que sobe, pelos prazeres da carne.

Embasbaquei – me com uma planta que só vive nas alturas. Entre o verde das árvores fazem um clarão prateado. As folhas da Fraile Jon são punhais de veludo. No tempo certo oferecem flores amarelas.

Biblioteca Luís Ángel Arango: 1o das Américas. Formou-se com os livros que os jesuítas deixaram, quando foram expulsos das Colônias em 1777. O acervo soma 1 milhão de títulos. Pro bem de todos, as gentes são dadas à leitura.

Museu Botero: além das obras, o casarão. Fernando - nasceu em Medellín e está com 81 anos - doou ao país parte de suas pinturas, esculturas, desenhos e aquarelas. Junto, obras de Monet, Renoir, Dalí, Picasso.

Na entrada, a escultura de uma mão esquerda aberta é o 1o impacto. Botero pintou cenas do cotidiano e personagens imortalizados pelos grandes mestres. Sua “Monalisa“ nos olha marotamente. Irresistíveis, os redondos casais que dançam. Sua mãe viúva costurando pra sustentar os filhos ainda pequenos. Mulheres gordas nuas, com bundas formidáveis e longos cabelos negros.

Fez “A Morte Tocando Guitarra“. Peladaça sorri cheia de dentes. Diz-nos que sua função, por simples, natural e rápida, lhe dá tanto prazer que cabe acompanhar o evento, com alegre sonoplastia. “Mulher com Pássaro“. A cafetina ruiva e vesga administra seu negócio toda enfeitada. Usa brincos de esmeraldas e colar de corais. Como não é de ferro aguenta o tranco, segurando uma garrafa de rum. No ombro, o papagaio mascote da casa, que fala palavritascondizentes com o festejado estabelecimento.

Num dos portais de pedra do casarão escreveram: “governando, Fernando VI, o justo.”Bajulação descarada ou gozação oportuna???? Os do Trono eram tudo, menos justos.

Catedral do Sal / 1954: viagem de 50 minutos passando por plantações de rosas, cravos, morangos, batatas e soja. Por pastos fartos pras vaquinhas leiteiras - manteiga e queijos, de revirar os olhos. Ao longe, de todos os lados, as florestas vestem as montanhas com todas as tonalidades do verde.
Ao lado da colonial Zipaquirá / 1.600, a mina.

Quando as placas tectônicas do Pacífico deslocaram, montanhas submersas vieram à tona.

Algumas, transbordando de sal. Bem antes dos mineiros extraírem o depositado e pensarem em fazer nas cavernas locais de oração, os que por ali moravam há 375 anos a.C., já se serviam desse mimo da natureza.

Profundidade: 180 metros. Em 2 horas de caminhada, ida e volta só deslumbramento. Pelos túneis e galerias acompanhamos as 14 estações da paixão. Cruzes e relevos nas paredes apontam os passos de Jesus ao Gólgota. Suave sonoplastia acompanha os nossos.

No fundo, as capelas. Na da pia batismal desce os 16 metros da parede, cascata de sal como se fosse volumosa espuma branca. Na principal, do alto do coro, nos fascina a cruz do suplício. Gigantesca, rajada de cores, flutua. No centro, a projeção em vermelho do coração pulsante de Jesus.

Chegando à nave vemos que a cruz não pende do teto. Foi esculpida na rocha em baixo relevo.

Entre as esculturas em mármore e pedra sobressai o “Medalhão da Criação“: Carlos Rodrigues e Hugo Corredor, reportando-se a Michelangelo e à Capela Sistina esculpiram em mármore, no
piso, o instante no qual o dedo de Deus dá vida a Adão e aciona os elementos. Os artistas, sem contemporizações, mostram que a criatura é imperfeita. Adão não tem olhos.

Passando pela loja e pelo Café, o derradeiro despencar de queixo. De um balcão admiramos as formas e as cores das rochas que estão embaixo. Na real, trata-se de espelho d’água de 10 centímetros que reflete o teto da galeria.

O projeto: Roswell Garavito. O trabalho de Arquitetura: Mirian Toro. O de Engenharia: Jorge Castelblanco.

Como não se pode descrever o indescritível, esse meu conversê é nada. Há que estar lá, de corpo presente.

Casa de Manuelita Saenz e a versão colombiana do seu tórrido romance com Bolívar:

a “libertadora do libertador“ nasceu em Quito – Equador / 1795, de mãe solteira. Quando a moça morreu, seu Saenz não sumiu do mapa. Levou a criança pra sua mulher criar. Péssima ideia. Papai internou a menina num colégio de freiras. Inteligente, destemida, cheia de opiniões e atitudes, mocinha, pirulitou do recinto dando-se aos braços de um jovem soldado.Señor Saenz tentando controlá-la providenciou seu casamento / 1817, com comerciante inglês residente em Lima.

Fleumático, permitiu que Manuelita circulasse. Foi pra Quito / 1822 e lá conheceu Bolívar. Então, explodiu a paixão que ficou na História. Simón levou-a pra Bogotá/1828.
Fortíssima, pitaqueava sobre tudo, com todos.
Como o poder absoluto é irresistível, o presidente sofreu atentados. Ela, sempre ao lado de seu homem.

Quando Bolívar morreu / 1830, a que era toda poderosa foi expulsa do país. Faleceu, com tifo, aos 61 anos na cidade portuária de Paita / Peru.
Na casa / de 1713, busto de bronze mostra uma bela mulher, carnuda, confiante em si mesma. A peça de Jorge Cobo, um presente do Equador à Colômbia.

Além de pertences da señora de la casa, o museu expõe trajes muiscas e os regionais. Muitas flores e cores nas blusas, nas saias compridas e nos lenços. Os homens, loucos por chapéu. A coleção encanta.

Mesmo os espanhóis ditando o que as gentes, nas suas classes sociais, estavam autorizadas a vestir, não conseguiram matar a alegria de viver estampada nas roupas.

Entrevista na TV: o assunto era Cinema. À mesa, jornalistas. O apresentador faz a 1o pergunta pra moça. Mal abre a boca, o rapaz a interrompe falando junto com ela. O outro também deita falação. O mediador do que deveria ser um debate dá seu palpite. Seguem monologando sem nenhum constrangimento. Como falavam todos ao mesmo tempo, os telespectadores - imagino - como eu, com cara de ostra ficamos sem saber qual a proposta do encontro e qual a opinião dos participantes. Uma lástima que essa prática tenha extrapolado da roda de amigos. Não interessa ouvir o que as pessoas têm a dizer. Importante é falar, ainda que seja pra si mesmo. Oba!!!! Viva Nóis!!!!

Entre os inúmeros monumentos, o destaque vai pro que imortaliza Policarpa Salabarrieta, heroína da revolução pela independência. Tinha 21 anos quando enfrentou o pelotão de fuzilamento.

Quinta de Bolívar / de 1804: o presidente instalou-se nesse casarão fazenda,
ao pé do Monserrate. Átrio com pedras de rio, estábulo, varandas, jardim, bosque e cascata.
Nos cômodos, coisas e loisas do morador.
Contam que Manuelita era assídua frequentadora. Chegava à noite a cavalo, de uniforme. No primeiro raio de sol voltava pra casa. Nesse sistema, a paixão dura séculos.

Plaza de Toros / 1931: no bairro de La Macarena, em tijolinho à vista, acolhe 14.500 espectadores. Proibido que está o espetáculo de sangre y arena, o coliseu é palco pra concertos e shows.

Museu de Arte Colonial: o casarão é de 1605. Pintura religiosa em molduras que, por si só, fazem valer a visita. Ainda, oratórios, prataria de igreja e: “São Francisco de AssisRecebendo As Chagas“. O santo projeta-se do quadro, em alto relevo. “Nossa Senhora e o Menino“. A doce Maria usa um brinco / arete real, fixado na tela.

“A Cidade da Imaginação“ vive de arte e cultura: a mente, o espírito e os sentidos saboreiam as maravilhas da criação humana. As gentes e os do governo valorizam seus artistas. Nos festivais, Bogotá promove rituais anuais às musas. Desde 1988, o Festival Ibero- Americano de Teatro. São 2.209 companhias que encenaram 9 mil espetáculos pra 3 milhões de espectadores, em 2012. Dá-lhe dona Colômbia!!!!

Não é propaganda enganosa quando dizem: “o perigo é você querer ficar”.

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